Treino de Força na Corrida
treino de força trail running

A força é uma capacidade condicional muito importante no rendimento desportivo de um atleta, bem como na prevenção de lesões. O treino de força é um excelente meio para promover adaptações ao nível da força em corredores de média e longa distância, resultando na melhoria da velocidade máxima, economia de corrida, VO2máx e prevenção se lesões. Estas melhorias devem-se principalmente a adaptações neuromusculares provocadas pelo treino, com cargas e intensidades adequadas à condição física do atleta.

Assim, o treino de força é importante na melhoria do rendimento desportivo do corredor e como prevenção de lesões. Esta capacidade condicional é a base para o bom desempenho da técnica de uma atividade, desempenhando um papel determinante nas modalidades desportivas de corrida em montanha, pois o atleta tem de mover o seu corpo durante muito tempo, superando a gravidade nas subidas ou resistindo-lhe nas descidas, existindo a necessidade de aplicação de força concêntrica ou excêntrica, respetivamente.

A força tem ainda um impacto significativo na melhoria de outras capacidades físicas, como a velocidade e a resistência cardiorrespiratória na melhoria da potência muscular, sendo o seu treino fundamental para que ocorram melhorias na economia de corrida e consequentemente na velocidade de deslocamento.

Além do treino de força para os membros inferiores, também é fundamental fazê-lo para a parte superior do corpo, pois os ombros, braços, costas e tórax contribuem para o comprimento da passada na corrida. Não sendo imperativo o corredor ter níveis muito altos de força nos braços, é importante conseguir manter estes em movimento constante por longos períodos, pois também ajudam na propulsão do corpo. Também a força dos músculos do abdómen é importante, pois permite estabilizar a pélvis, coluna e ombros, aumentando assim a eficiência propulsiva dos braços e pernas.

De que depende o nível da força?

treino de força fibras musculares

O nível de força que um músculo consegue gerar depende da área de secção transversa do músculo e fibras musculares, do tipo e da quantidade de fibras musculares estimuladas a contrair, e da velocidade de contração. Esta estimulação de fibras está dependente da quantidade de unidades motoras recrutadas, ou seja, quanto mais unidade motoras forem recrutadas maior será a força gerada pelo músculo. Este aspeto em particular pode ser melhorado através do treino de força máxima, podendo melhorar-se a velocidade de contração dos músculos através de treino de força explosiva.

Como treinar força na corrida?

treino de força trail running ginásio

O treino de força na corrida pode ser feito de diversas formas, através de meios gerais, especiais ou específicos, devendo a organização do treino ser programada de forma a que sequencialmente haja um transfer dos ganhos de força entre estes meios, começando pelos gerais e ir progredindo até aos específicos.

De acordo com a literatura, o treino de força deve ser planeado tendo em conta estas 4 fases sequenciais, onde se incluem os meios referidos acima:

  1. Adaptação anatómica: permite uma adaptação dos músculos e estruturas tendinosas a esforços mais exigentes, maior estabilidade articular, sendo particularmente importante na prevenção de lesões;
    • Treino de força geral: pode ser usado durante toda a época (com maior predominância no início), permite trabalhar todos os músculos do corpo, com cargas médias a altas, mas não têm grande transfer para o ato de correr;
      Exemplo de exercícios: - abdominais, flexões, trabalho com máquinas de ginásio com cargas-submáximas (bíceps e tríceps, adutores e abdutores, prensa, deadlift, agachamentos), burpees, etc;
  2. Hipertrofia: aumento de massa muscular;
  3. Força máxima: treino com cargas máximas para estimular o aumento de unidade motoras recrutadas;
    • Treino de força especial: trabalham-se movimentos com pequenas semelhanças ao movimento da corrida e que têm algum transfer para o ato de correr, permitindo fazer trabalho isolado de alguns músculos.
      Exemplo de exercícios: trabalho de ginásio com cargas submáximas a máximas: leg extension, leg curl, dead lift, gémeos na prensa ou na multipower, lunges com peso extra, etc.
  4. Conversão para potência/resistência: treino de força resistência e explosiva para aumentar a velocidade de contração das unidades motoras.
    • Treino de força específica: os métodos de treino de força específica têm total transfer para o ato de correr, permitindo trabalhar a força de forma idêntica ou muito próxima à aplicada na competição.
      Exemplo de exercícios: Walking lunge, step up, multisaltos, corrida em escadas, rampas curtas de alta intensidade.

*Apesar de me referir a cada meio de treino de força em uma única fase, este pode ser interpretado como treino de maior predominância, podendo treinar-se durante a maior parte da época, mas com diferentes volumes em cada fase da época desportiva.

O treinador ao fazer o planeamento de treino que inclua trabalho de força, deve ter o cuidado de:

  • Prescrever exercícios para os diversos grupos musculares, de forma a manter um equilíbrio de força entre os grupos musculares agonistas e antagonistas e contralaterais (esquerdo e direito);
  • Os exercícios devem ser organizados de forma a que o praticante execute primeiro os poliarticulares que envolvem grupos musculares maiores, e só depois os monoarticulares para grupos musculares menores;
  • A intensidade dos exercícios deve ser inversamente proporcional ao número de repetições;
  • Nos dias em que o foco esteja no trabalho de força, o volume e intensidade do treino de corrida devem ser mais reduzidos;
  • O volume e intensidade devem ser adequados aos nível físico do atleta e ao período da época em que se encontra, sendo maior numa fase inicial e mais reduzido nos períodos competitivos;
  • Principalmente nos períodos competitivos deve ter-se sempre especial atenção em prescrever exercícios específicos, que simulem mais o gesto técnico da corrida, permitindo um maior transfer do ganho de força para o gesto, tornando a sua execução mais eficaz.

Desta forma, permite-se que ocorram as adaptações pretendidas e que irão potenciar o nível de desempenho desportivo do atleta, reduzindo a probabilidade de overtraining e ocorrência de lesões.

Portanto, esta é a forma como alguma bibliografia defende que o treino de força deve ser planeado e realizado, com a qual eu concordo e oriento o meu treino e dos meus clientes. No entanto, é importante voltar a referir que não é imperativo que seja assim em todos os casos. O treino deverá ser sempre adaptado ao praticante, devendo o treinador ter em conta a sua condição física, objetivos, problemas de saúde ou lesões, disponibiliade, etc...

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